A apatia e a – como diagnosticou Cuca em coletiva – “falta de agressividade” verificada no time do Palmeiras na partida do último sábado é uma das poucas coisas que mesmo a porção menos emocional da torcida consegue tolerar – e isso se agrava quando se trata de um clássico. E se esse clássico é no Morumbi, aí realmente não há a menor chance de encarar de forma natural.
Uma das possibilidades para se tentar entender a postura inaceitável do time em campo seria a dificuldade em virar a chavinha para o Brasileirão em meio a tantas disputas de mata-mata. O Palmeiras tem, entremeadas às 35 rodadas que ainda faltam até o fim do Nacional, potenciais 15 jogos de mata-mata – oito pela Libertadores, cujo sorteio para definir a chave acontece no dia 14 de junho, e mais sete pela Copa do Brasil – a próxima partida já acontece na próxima quarta-feira, quando o Verdão vai tentar alcançar no Beira-Rio as quartas-de-finais depois da vantagem construída na partida de ida.
Diante do afunilamento das competições, é natural que haja alguma dificuldade em acertar o foco num torneio de 38 jogos que está apenas na terceira rodada. E esse privilégio não é nosso: uma rápida corrida de olhos na classificação revela que quatro dos seis times que seguem na Libertadores estão na metade de baixo da tabela – e não estão apenas mal colocados, mas também jogando mal. O Grêmio, que ontem teve a chance de emplacar 100% de aproveitamento no Brasileirão, jogou com um time alternativo e tomou quatro gols do Sport; o Botafogo venceu o Bahia em casa e o principal jogador do time foi seu goleiro.
(Aqui, cabem parênteses: o desempenho do goleiro é um diferencial negativo na campanha do Palmeiras até agora – Fernando Prass falhou feio nos dois gols do adversário no último sábado e foi duramente criticado. Ninguém que veste a camisa do Palmeiras está imune a críticas; o que varia é o tom. Fernando Prass jamais teve um comportamento que merecesse qualquer repreensão, tem uma pilha de créditos acumulada e é, tecnicamente, um dos melhores do país. Não há nada que deva abalar nossa confiança em nosso goleiro. Ele mesmo criticou sua atuação e isso basta; ler palmeirenses o xingando e o desrespeitando é algo que torna a digestão de uma derrota com a de sábado mais difícil ainda.)
Vem de cima?
Não é apenas a falta de foco dos atletas. O próprio Cuca vem dando pistas de que o Brasileiro está um tanto à parte do foco principal. A escalação do time no sábado, sem Edu Dracena, Zé Roberto, Roger Guedes e Borja, intriga. Pode ter sido por opção técnica ou tática. Ou porque a fisiologia deu o alerta e eles estavam no limite para estourar e precisavam de descanso. Ou por mera precaução, um rodízio estruturado para administrar o esforço do grupo durante toda a temporada.
No caso da última hipótese ser a verdadeira, estamos diante de um equívoco monumental. Mesmo que estrategicamente o clube tenha avaliado que não tem condições de vencer as três competições e tenha decidido priorizar as menos longas e exigentes do ponto de vista físico – algo que por si só já seria questionável – um clássico no Jardim Leonor jamais poderia ser tratado como um jogo qualquer. Lá, tem que ser força máxima, sempre.
Vencer clássicos é o que faz a torcida abraçar um time durante uma campanha. Na mão inversa, perdê-los é o que traz para o ambiente uma tensão que nenhum atleta quer ter que enfrentar – e tudo se potencializa quando as derrotas vêm de forma estúpida, como nos clássicos em Itaquera e o do último sábado.
Aprendendo a virar a chavinha
Virar a chavinha toda hora não deve ser fácil, mas é um desafio que o atual grupo do Palmeiras precisa aprender a vencer. Mesmo que o Brasileiro tenha sido definido como objetivo secundário, a atitude em campo jamais pode ser apática como a que vimos no último sábado, nem que fosse um jogo comum.
O Brasileirão pode ser a competição mais longa e desgastante, mas também é a que o Palmeiras, diante da força de seu elenco, tem a maior chance de conquistar. Os mata-matas são empolgantes e há quem tenha obsessão pela Libertadores; de fato é a que confere ao vencedor a maior glória. Mas colocar todos os ovos em competições eliminatórias, onde um detalhe não define zero, um ou três pontos, mas sim a vida ou a morte na competição, sobretudo quando isso implica em perder clássicos de forma vergonhosa, é um risco que o Palmeiras não pode correr.