Palmeiras estuda nova e perigosa alteração estatutária

Maurício Galiotte
Divulgação

O Conselho Deliberativo do Palmeiras estuda nova alteração estatutária a ser votada nas próximas semanas. O principal ponto a ser apreciado pelo Conselho, posteriormente pela Assembleia Geral é a mudança da duração do mandato do presidente do clube, passando de dois para três anos.

A duração do mandato do presidente sempre foi um dos maiores entraves para a vida política do clube. Uma gestão de dois anos faz o presidente ter praticamente metade de seu mandato em ano eleitoral – algo que notoriamente dispersa a atenção e o foco no que realmente interessa, o futebol. Como no primeiro ano o presidente ainda está se inteirando dos fatos e implantando seus projetos, resta pouco tempo para que o clube seja gerido com 100% da atenção que necessita. Um mandato de três anos dá muito mais tranquilidade para que o trabalho, cada vez mais profissionalizado, seja bem desenvolvido.

Um dos argumentos contrários à mudança prega que, com um prazo maior, os prejuízos de se ter um novo Tirone como presidente seriam muito maiores. O que é uma enorme verdade.

Mas não é por causa desse risco que se deve recuar diante da mudança que se desenha. O Palmeiras tem que cuidar mais ainda para não colocar no cargo algum inepto. A eleição ficará mais séria ainda do que já é. Não podemos nos furtar a fazer o certo por medo de não sermos capazes de evitar que se repita o desastre de se eleger alguém com pouco comprometimento com nossas cores. Não é este o perigo.

A coisa certa, ao tempo certo

Ao mesmo tempo que precisa corrigir esta falha em sua estrutura política, o Palmeiras precisa respeitar o tempo para que as alterações não pareçam casuístas. A partir do momento em que a alteração for feita, é preciso guardar pelo menos um ano para que a uma eleição contemple os efeitos dessa mudança. A eleição presidencial para novembro próximo não pode dar já ao próximo mandato a extensão do tempo.

O correto é que a eleição de 2018 permaneça dando ao eleito uma gestão até o fim de 2020; a eleição em novembro de 2020 é que elegeria o primeiro presidente com mandato trienal.

O histórico escancara a manobra

Leila Pereira em campanha
Sergio Barzaghi/Gazeta Press

Depois de reduzir de oito para quatro anos como conselheiro o prazo para poder se candidatar à presidência, o Palmeiras pretende afrouxar ainda mais os pré-requisitos. Se o mandato de três anos for aprovado já para 2018, os conselheiros eleitos em 2017 serão os maiores favorecidos.

Pelo texto atual do Estatuto do Palmeiras, é necessário que um conselheiro tenha um mandato completo (quatro anos) para concorrer à presidência do clube – este prazo foi reduzido pela metade na última alteração estatutária, fato incomum na conservadora política do clube, que sempre preferiu períodos mais longos para afastar “aventureiros” do comando alviverde.

Se o eleito em novembro próximo já tiver um mandato de três anos, ele entregará o cargo em dezembro de 2021; os conselheiros eleitos em fevereiro de 2017 já terão completado seus mandatos de quatro anos e poderão assim ser candidatos ao cargo máximo do clube.

A alteração, a toque de caixa, é claramente casuísta e visa facilitar para que Leila Pereira seja candidata a presidente do clube em novembro de 2021. O Palmeiras, desta forma, entregaria as decisões do futebol do clube a quem coloca dinheiro no clube, num evidente e perigoso conflito ético.

Até a eleição de 2015, eram necessários pelo menos onze anos como sócio do clube para ser candidato à presidência: além dos dois mandatos de quatro anos como conselheiro, havia ainda a carência inicial para que o associado recém-admitido pudesse concorrer ao Conselho. Como num passe de mágica, uma associada de 2015 teve sua data inicial alterada para 1996, e poderá, apenas seis anos depois de confeccionar sua primeira carteirinha, ocupar a cadeira mais importante do mundo.

Se começa errado, acaba errado

Mauricio Galliote e Leila PereiraÉ evidente que o ritmo acelerado com que as coisas acontecem para favorecer Leila Pereira em sua caminhada ao poder num ambiente tão conservador como o Palmeiras mostra que houve algum catalisador no processo – e é pouco provável que tenha sido apenas o carisma da dona das empresas que patrocinam o clube.

Os benefícios de se ter os cofres sempre cheios possibilitam ao clube montar um elenco poderosíssimo. Mas isso, como vimos nos últimos dois campeonatos, não são suficientes para erguer troféus. Um patrocinador forte é capaz de reequilibrar a balança na briga com os dois clubes favorecidos pela rede de televisão detentora dos direitos de transmissão, mas se a gestão do clube não for focada em futebol, o mais provável é que sigamos ouvindo na imprensa que o clube deixou de ganhar campeonatos “apesar do alto investimento”.

A Crefisa e a FAM são parceiros excepcionais do clube e devem ser tratados com o máximo respeito e consideração, mas há linhas que não podem ser rompidas. O presidente do Palmeiras tem que ser uma pessoa ligada ao futebol e com raízes no clube. E isso só o tempo provém. Quem pega atalhos, além de não acumular a bagagem necessária, usa de meios questionáveis para atingir seus fins – algo que hoje repudiamos em nosso inimigo, ex-rival, e que não queremos ver por aqui.

A função do patrocinador é patrocinar; apoiar financeiramente em troca de visibilidade para seus produtos e serviços. Esse é o acordo – ou pelo menos, deveria ter sido. É perfeitamente lícito a qualquer empresário ter ambições políticas num clube de futebol, desde que, a partir do momento que assumir essa ambição, cesse qualquer relacionamento financeiro entre as partes.

Até porque, a partir do momento em que os bolsos da presidente e da patrocinadora forem os mesmos, o modelo de receita do clube tende a ser cada vez mais concentrado, tornando o Palmeiras refém de sua patrocinadora/presidente, cujo temperamento instável já rendeu até ameaças de “patrocinar o Flamengo, que tem mais visibilidade” em outros episódios.

Uma Leila presidente que acumule a função de patrocinadora não serve. Ao alterar o sólido modelo de receita construído nas últimas gestões, torna-lo-á frágil, dependente de sua vontade e de seu humor. Possivelmente será soberana, totalitária, como já é em sua empresa. A ética terá ido para o espaço. E quando romper o vínculo, jogará o clube em situação de penúria – algo semelhante ao que ocorre atualmente com o Fluminense, após a saída da Unimed.

Alexandre Mattos e Mauricio Galiotte

Uma Leila presidente, sem o patrocínio da Crefisa e cheia de ética, deve ser apenas melhor que o Tirone, a despeito de sua suposta competência como gestora de uma empresa financeira – a não ser que percorra o tempo necessário como sócia e conselheira para aprender como funciona o meioe isso pressupõe que não pegue (mais) atalhos. E que ninguém se iluda que apenas “ter o Mattos a seu lado” será suficiente. Alexandre Mattos é um comerciante excepcional; ele compra e vende jogadores por valores fantásticos e consegue ótimos acordos. Mas não é exatamente um montador de elencos brilhante; é preciso gente notoriamente do ramo para balizá-lo, além da grana de um novo patrocinador. Uma equipe improvável.

É por tudo isso que, se o clube alterar o mandato para a presidência para três anos já a partir da eleição de 2018, estará dando um passo perigosíssimo e colocando em risco todos os avanços que conquistamos nos últimos anos. Três anos, sim – mas só a partir de 2020. CUIDADO PALMEIRAS!


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