E agora, José?

Cuca errou na escalação para o jogo de ontem contra o Cruzeiro, no Allianz Parque. Ao escalar Edu Dracena e Zé Roberto juntos, deixou o lado esquerdo muito lento. E isso já era pedra cantada, conforme se pode ler no pré-jogo. Mas há algumas razões que podem tê-lo induzido a cometer esse erro.

Jean não tinha condições físicas. Sem poder contar com Arouca, Felipe Melo e Bruno Henrique, única alternativa para a volância, ao lado de Tchê Tchê, era Gabriel Furtado. O menino, de 17 anos, foi muito bem no jogo-treino contra o São Caetano e no primeiro tempo em Campinas, mas talvez Cuca não tenha sentido confiança para lançá-lo num jogo de tamanha envergadura. Thiago Santos foi para o jogo com sabe-se lá quanto % de sua condição física e o primeiro e terceiro gols do Cruzeiro saíram em jogadas de velocidade aproveitando um enorme vazio no meio-campo.

Cuca pode ter imaginado que Robinho e Thiago Neves não representavam ameaças velozes para o lado esquerdo que ele montou, ainda mais com a proteção por seu homem de confiança. De fato, em tese, não eram. Mas na hora de fazer a cobertura no lance do primeiro gol, Zé Roberto não conseguiu acompanhar a linha de Diogo Barbosa pelo meio e o cruzamento por baixo encontrou Thiago Neves livre. E não foi a primeira vez nesta temporada que levamos um gol em cima de sua falta de explosão.

José Roberto da Silva Júnior tem um lugar cativo na galeria de ídolos do Palmeiras. Sua presença foi fundamental na retomada da grandeza do clube a partir de 2015, desde sua histórica preleção antes do primeiro jogo da temporada. Com liderança e excelência técnica, foi o símbolo do primeiro título de uma nova era do Palmeiras. No Brasileirão de 2016, protagonizou um lance histórico, contra o próprio Cruzeiro, em Araraquara, que também foi um dos símbolos da conquista. Por tudo isso, merece todo o respeito na reta final de sua carreira. Cuca precisa usá-lo em ocasiões específicas, em partidas que sua experiência no meio-campo seja bem-vinda. Se insistir em usá-lo como lateral, pode acabar esmaecendo o brilho de sua passagem pelo Palmeiras.

Na direita, mais problemas

Fabiano foi substituído aos 31 minutos logo após o terceiro gol do Cruzeiro, após levar um facão de Alisson. A jogada foi em velocidade e é muito difícil de marcar quando sai bem encaixada. Já no primeiro gol, nenhuma responsabilidade; ele estava na área ofensiva buscando o cabeceio num escanteio e havia cobertura. A vaia de grau 8 na escala Wesley que recaiu sobre ele provavelmente foi efeito da frustração coletiva de ver o time tomar de 3 com meia hora de jogo – mas ele não estava bem de qualquer forma.

Circunstâncias

Se parece definitivo que não podemos mais usar Zé Roberto na esquerda, a alternativa imediata a ele é Egídio. Com mais de dois anos de clube, o camisa 6 jamais passou segurança enquanto defensor; ontem, diante da postura avassaladora do Palmeiras no ataque no segundo tempo, saiu-se bem. Mas sabemos que ele não é uma alternativa confiável.

Para o Brasileiro e a Libertadores, Juninho surge como opção para fazer a lateral esquerda, mas é uma solução do tipo “cobertor curto” – seu desempenho no apoio é deficiente. Para a Copa do Brasil, Michel Bastos poderia ser a solução, embora não tenha apreço em atuar na posição em que surgiu para o futebol. Ontem, Michel estava fora de combate.

Já na direita, sem poder contar com Mayke e Jean, só foi possível usar Tchê Tchê ontem porque o time abriu mão de um volante diante da necessidade de atacar – e mesmo assim, arriscando ficar sem volantes porque Thiago Santos estava amarelado.

Em resumo: no início do ano, julgou-se que os laterais que encerraram o ano passado seriam suficientes para os desafios de 2017: Jean, Fabiano, Zé Roberto e Egídio – com Tchê Tchê e Michel Bastos fazendo as terceiras opções. Hoje, concluímos que a avaliação foi equivocada.

Mattos já se mexeu, trazendo Mayke e Juninho, que também não são soluções completas, mas é com eles que vamos até o fim do ano, sem poder usá-los na Copa do Brasil. De qualquer forma, diante de tantas circunstâncias negativas, não deixa de ser notável o remédio que Cuca conseguiu administrar ontem ao time para chegar ao empate, mexendo em quase todas as posições com apenas três substituições.

Vazamento

Não deixa de ser notável também o fato de que Cuca foi surpreendido pela postura tática do Cruzeiro. Outro jogo em que ele teve dificuldades no primeiro tempo foi contra o SPFC, no Morumbi. Em ambos, um ponto em comum: a escalação vazou bem antes do jogo começar. Ontem, por volta de 17h, a imprensa já tinha a informação – e provavelmente Mano Menezes também, assim como Rogério Ceni algumas semanas atrás.

Maurício Galiotte
César Greco / Ag.Palmeiras

Cuca até brincou coma situação depois do clássico, sugerindo que o SPFC poderia ter algum espião nos prédios que ficam a mais de 300m da Academia de Futebol. Na verdade, era um recado claro à direção, alertando que esses vazamentos estão atrapalhando o time. Deu certo; o ambiente voltou a ficar relativamente blindado e, com a escalação protegida, o time conseguiu envolver os adversários nos últimos jogos. Ontem, no entanto, essa proteção falhou. Alguém deu com a língua nos dentes e tomamos um baile no primeiro tempo que poderia ter sido fatal.

Enquanto pessoas alheias ao futebol tiverem acesso a informações cujo segredo é fundamental para um bom desempenho em campo, todo o esforço dos jogadores e comissão técnica acabam ficando em segundo plano. A confidencialidade da escalação e o fim dos vazamentos, que já foi tema de uma cobrança formal do grupo Fanfulla (não respondida pelo presidente), seguem sendo uma realidade distante da Academia de Futebol.